A cronologia da Guerra Civil de Espanha inicia-se a 17 de Julho de 1937, data do pronunciamento militar em Melilla contra o governo da República.
Estudos sobre a Guerra Civil de Espanha aqui.
«Foi em Praga, República Checa, na Primavera do ano de 2003, que me encontrei pela primeira vez com Hyok. Este rapazinho inteligente e tímido tinha sido convidado para este país de Leste por uma organização de defesa dos direitos humanos, a fim de dar testemunho sobre a sua vida na Coreia do Norte. Dois outros desertores, com uns quarenta e tal anos, tinham sido igualmente convidados. Eles evocaram longamente as suas dolorosas experiências no gulag norte-coreano. O jovem Hyok, pelo seu lado, sem dúvida devido ao seu carácter reservado, não se arriscou a pegar no microfone. Em contrapartida, o essencial daquilo por que tinha passado encontrava-se exposto nos pontos mais altos da sala alugada para essa ocasião, sob a forma de desenhos de traços umas vezes precisos, outras vezes desajeitados, mas sempre marcados por aquela sinceridade espontânea tão própria das crianças. O que ele tinha tanta dificuldade em exprimir por palavras desenhava-o às mil maravilhas, com uma excelente memória de pormenores.
Depois de ter fugido da Coreia do Norte em 1998, Hyok tinha vivido quatro anos na China e podia assim exprimir-se um pouco em chinês, língua que eu próprio falava. Tirando partido dessa ponte comum, convidei-o para se sentar à mesa comigo num restaurante de Praga. O adolescente contou-me como tinha sobrevivido à fome na Coreia do Norte: as sopas de casca de árvore, a caça aos ratos que fazia com os seus companheiros, as horas passadas a arrancar carvão nas galerias da mina, os roubos nocturnos nas herdades do Estado; o enfraquecimento, e depois a morte, de muitos dos seus camaradas de escola... Hyok relatava-me esses episódios com um ar indiferente, como se me falasse de um dia igual aos outros. Aquilo pelo qual tinha passado com olhos infantis alguns anos antes, milhões de outros norte-coreanos tinham-no igualmente vivido no seu quotidiano - e continuavam a vivê-lo no momento presente.
(...)
Três meses depois da minha entrevista em Praga com Hyok, fui ao seu encontro na Coreia do Sul, e foi em Seul, na sequência de duas semanas de colaboração e de troca de impressões, que este livro começou a tomar forma (...).
"Quando conto como é a vida na Coreia do Norte aos miúdos da minha idade na Coreia do Sul, na maior parte do tempo eles não acreditam em mim", confiou-me Hyok. O que é que isso tem de espantoso? Como descrever esses país das inverosimilhanças? A Coreia do Norte abriga um dos mais detestáveis totalitarismos do planeta. Caracteriza-se por um culto da personalidade extravagante, uma economia destruída, um império da mentira e da propaganda e um gulag de pelo menos duzentos mil prisioneiros. Este «Jurassic Park» do comunismo distila um ambiente paranóico de guerra fria onde a denúncia de qualquer forma de dissidência é erigida como virtude. A sua população está repartida em diversas dezenas de «castas» sociais hierarquizadas pela burocracia segundo o seu grau de lealdade real ou suposta em relação ao «Querido Líder» Kim Jong-Il (filho do falecido «Grande Líder» Kim Il-Sung, que morreu em 1994). A fome que ali grassa desde 1993-1994 saldou-se por dois ou três milhões de mortos entre as categorias mais vulneráveis, apesar de uma ajuda internacional maciça: esta foi, em grande parte, desviada pelo regime em proveito do seu aparelho militar. (...)
A Coreia do Norte é também o Estado mais fechado do mundo. Todos os receptores hertzianos, de rádio ou de televisão, são bloqueados pelas frequências oficiais e nenhum jornal estrangeiro se encontra disponível. Apesar disso, os desertores que conseguem fugir desse país, fechado a sete chaves, de vinte e três milhões de habitantes são cada vez mais numerosos. Cerca de trezentos mil norte-coreanos conseguiram refugiar-se na China desde meados dos anos 90. Desses, vários milhares chegaram à Coreia do Sul, arriscando a vida. Contudo (...) raros são os editores e jornalistas que se interessam pelos seus relatos surpreendentes. Aqui temos um desses testemunhos excepcionais, o de uma criança, e por isso mesmo único.»
Phillipe Grangereau, «Prólogo» a Hyok Kang/Phillipe Grangereau, «Aqui É o Paraíso!», Uma infância na Coreia do Norte, Editora Ulisseia, colecção «Os Afluentes da Memória», tradução de António Carlos Carvalho, desenhos de Hyok Kang, Lisboa, 2007.
ISBN 978-972-568-568-6
O livro Meninos de Ninguém, da jornalista Ana Cristina Pereira,
publicado pela Ulisseia,
será apresentado por Julieta Monginho e Adelino Gomes
no dia 9 de Maio, às 18:00h, na Esplanada Central da Feira do Livro
Blog: http://meninosdeninguem.wordpress.com/
© Ana Cristina Pereira e Editora Ulisseia, 2009
Fotografia da capa © Nelson Garrido/Público
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Ana Cristina Pereira estudou Comunicação Social na Universidade do Minho. É jornalista do Público desde 1999. Dedica-se, sobretudo,às temáticas de exclusão social, como a pobreza, os tráficos, as dependências, as piores formas de trabalho infantil, a delinquência juvenil, a violência intrafamiliar, a reclusão, as migrações, as minorias. Meninos de Ninguém é o seu primeiro livro. Reúne histórias antes publicadas no Público – agora «libertas» das «amarras» próprias da imprensa diária. A escancarar a dura realidade de crianças que crescem em territórios críticos deste Portugal do princípio do século XXI.
Vamos falar de um novo livro, mas não apenas de mais um livro:
Mais informações muito em breve.
Morreu, no passado dia 26 de Novembro, Joaquim Foigueiredo Magalhães, fundador da Ulisseia, em 1948, e criador de um dos mais interessantes e importantes catálogos do panorama editorial português ao longo de várias décadas.
Annualia prestará homenagem a este editor proporcionando, em breve, uma visita à Ulisseia de há 40 anos, através do catálogo de 1968.
Simultaneamente aceitaremos e publicaremos contributos dos nossos amigos e leitores de homenagem a Joaquim Figueiredo Magalhães.