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«Neofigurativa no modo como trabalha livremente o corpo humano até ao esgotamento da sua integridade antropomórfica, no modo como torna operatórias as noções de metamorfose e fragmentação, no modo como actualiza o bestiário — fantástico ou doméstico —, através de uma interrogação acerca dos limites do Humano e do Animal, ora fazendo-o a partir da rememoração das tradições populares, ora reescrevendo-o a partir da tradição literária erudita, herdeira da poética surrealista, a obra de Paula Rego estende-se por grandes ciclos narrativos ou cenográficos, com preferência pelos formatos monumentais. A diversidade de técnicas e gestos que pratica (colagem, gravura, pastel, óleo...) é unificada pela permanência de uma linguagem expressionista — violenta quase sempre, a tocar os limites da perversão, por vezes —, que se afirma na mutilação, na distorção dos corpos, na ambiguidade das cenas retratadas — na fusão do imaginário infantil com os fantasmas, no sentido psicanalítico do termo, do universo adulto, na fusão intricada das coordenadas temporais, do passado e do presente, da experiência vivida à memória — tudo isto sublinhado por uma sofisticação cuidada no tratamento das cores e das texturas (...)».
Ana Filipa Candeias em Enciclopédia Verbo-Edição Século XXI, vol., 24, Lisboa, Setembro de 2002 (excertos)