por MÁXIMO FERREIRA *
Astrónomo
PRIMEIRA PARTE
Introdução
Em Março de 2004, o Departamento da UNESCO (Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações Unidas) com a responsabilidade do Património Mundial, o ROSTE (Comité Regional para a Ciência na Europa) e o ICOMOS (Conselho Internacional de Museus e Sítios), reuniram em Veneza um grupo de especialistas para estudar a possibilidade de incluir a categoria de «património astronómico» e a metodologia para a sua definição e implementação. Foi então decidido adoptar, provisoriamente, como critérios para considerar «património astronómico», os «objectos» (físicos ou imateriais) que apresentassem evidências de:
-Propriedades cuja concepção e/ou paisagem, tivessem relação com objectos celestes ou acontecimentos astronómicos;
-Representações do céu e/ou corpos celestes ou acontecimentos astronómicos;
-Observatórios e instrumentos;
-Propriedades com forte ligação à história da Astronomia.
Consumava-se, assim, mais um acto a contribuir para a concretização dos objectivos definidos na «Convenção relativa à Protecção do Património Mundial Cultural e Natural», adoptada (em 1972) pela UNESCO, em que se destacou o propósito de "encorajar os países a assinarem a Convenção do Património Mundial e a assegurarem a protecção do seu património cultural e natural" e de «encorajar a participação da população local na preservação do seu património cultural e natural».
Logo nesse ano de 2004 foi anunciada a intenção de o governo italiano solicitar àquela Organização das Nações Unidas a proclamação do ano 2009 como «Ano Internacional da Astronomia». Da fundamentação constava o facto de 2009 coincidir com o 400.º aniversário das primeiras observações do céu, através de telescópios, realizadas por Galileu, cidadão italiano.
Tendo em conta as implicações da Astronomia na cultura e na diversidade cultural – área das competências da UNESCO como agência especializada das Nações Unidas – na 62.ª sessão das Nações Unidas, em Dezembro de 2007, foi adoptada a resolução de declarar o ano de 2009 como Ano Internacional da Astronomia.
Dos argumentos invocados para tão importante decisão destacam-se:
a) O reconhecimento de que as observações astronómicas têm implicações profundas no desenvolvimento da ciência, filosofia, religião, cultura e concepção geral do Universo.
b) O conhecimento de que as descobertas de astrónomos no campo da ciência têm tido influência não só no nosso entendimento do Universo, mas também na tecnologia, na matemática, na física e no desenvolvimento social em geral.
c) A consideração de que o impacto cultural da Astronomia tem sido marginalizado e confinado a um público especializado.
d) A convicção do papel crucial que a UNESCO pode desempenhar na formação da opinião pública, no sentido de incrementar o seu conhecimento da importância da Astronomia para o desenvolvimento social, através do estabelecimento de ligações entre redes de investigação científica e a percepção cultural do Universo.
A União Astronómica Internacional criou um Secretariado que, propondo-se coordenar as diversas actividades em todo o mundo, preparou ainda um conjunto de sugestões aos países aderentes, das quais se destacam preocupações de envolver sociedades e associações de astrónomos profissionais e amadores e produzir exposições itinerantes, séries de conferências organizadas pelas sociedades nacionais, etc.
Em Portugal, ainda em 2007, a Sociedade Portuguesa de Astronomia iniciou a organização das actividades para o «2009 Ano Internacional da Astronomia», criando uma Comissão que estabeleceu contactos com entidades, instituições, sociedades, associações e mesmo individualidades ligadas a áreas profissionais de algum modo relacionáveis com a Astronomia, quer do ponto de vista científico, quer tecnológico.
Para além de diversas sugestões a Museus, associações de astrónomos amadores, grupos de astronomia em Escolas ou outras instituições (autarquias, editoras, espaços comerciais, companhias de teatro, orquestras, etc.), foram lançados concursos, destinados essencialmente a jovens estudantes, organizadas conferências, encontros de astrónomos profissionais e amadores, representações teatrais, concertos, feiras de bibliografia e equipamentos para astronomia de amadores e incentivou-se a produção e/ou tradução de obras de níveis e conteúdos diversificados sobre temas de Astronomia.
Naturalmente, da movimentação cultural que o Ano Internacional da Astronomia provocará em todo o mundo, são esperados inúmeros actos e reflexões sobre a presença da Astronomia nas culturas dos povos, ao longo dos séculos, em diversas regiões da Terra. Daí resultarão os primeiros factores que, certamente, vão conduzir à identificação e eventual classificação de «objectos» (relacionados com a Astronomia) como «património mundial».
*Texto inicialmente publicado no volume Annualia 2008-2009
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